Viagem ao Usuhaia - Terra do Fogo


Data da Viagem:

Saída: 11 de janeiro de 2013.

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Ushuaia é uma cidade da Argentina e capital da Província da Terra do Fogo. Seu nome provém do idioma indígena yagan:ushu + aia (fundo + baía = baía profunda), e é pronunciado em castelhano uˈswaʝa.
Sua região foi habitada pelo homem desde milhares de anos, e foi colonizada por europeus a partir de meados do século XIX, que instalaram missões para catequização dos indígenas. Estes, porém, logo desapareceram sob o impacto daaculturação e da devastação causada por epidemias trazidas pelos colonizadores. A cidade cresceu lentamente ao longo da primeira metade do século XX, principalmente em função da instalação de um presídio, que trouxe muitos funcionários administrativos e atraiu novos colonos, mas também fez com que se formasse uma impressão sombria sobre o local. A partir da metade do século o presídio foi extinto, a cultura se diversificou e o progresso se deu mais rápido, com a instalação de diversos serviços, a melhoria na infraestrutura urbana e a criação de incentivos governamentais para a fixação de novos residentes. Atualmente a cidade é um importante pólo turístico da Argentina e se tornou famosa como La ciudad más austral del mundo (A cidade mais austral do mundo) ou La ciudad del Fin del Mundo (A cidade do Fim do Mundo).

História

[editar]Pré-história


Mulheres yagan em fotografia do século XIX
Terra do Fogo foi habitada por povos indígenas desde cerca de onze mil anos atrás, procedentes do norte do continente. Entre esses povos estavam os onas, os chonkóiunka, os alacalufos e os yagans. Embora tivessem culturas particulares, eram em muito semelhantes entre si, tratando-se no geral de caçadores-coletores nômades que viviam em habitações extremamente rústicas e vestiam-se sumariamente, quando não passavam completamente nus a despeito das duras condições climáticas da ilha. Todos esses grupos se dividiam em pequenas comunidades autônomas, frequentemente em guerra entre si e com costumes diferenciados, formando um verdadeiro mosaico cultural.[1]
Na região de Ushuaia predominavam os yagans, estendendo sua presença até as duas entrada do Canal de Beagle e o Cabo Horn. Possuíam uma rica mitologia e uma língua surpreendentemente complexa e sutil para uma cultura paupérrima em todos os outros aspectos. Embora habitassem em terra, eram primariamente canoeiros nômades que se alimentavam de mariscos ou caçavam guanacos com arco e flecha, passando pouco tempo em cada local para logo depois levantarem acampamento e procurarem locais com alimentos mais abundantes. Disso deriva que sua concepção de mundo era peculiar, já que o entendiam a partir da água e não da terra. Passavam a maior parte do tempo nus ou vestiam apenas uma pele de animal atada sobre os ombros. Eram morenos, tinham uma estatura que não ultrapassava 1,6 m, sua vida era curta e as dificuldades da sobrevivência eram extremas, sendo a fome muito comum. Não hesitavam em comer carcaças semiapodrecidas de baleias e focas mortas que arribavam à praia. Apesar de terem uma colorida tradição mitológica e mágica, preservada pelos seus xamãs, não tinham um conceito de Deus ou de um Criador.[2][3]

[editar]Primeiros viajantes europeus


Mapa-mundi de 1544, de Battista Agnese, já indicando a rota de Magalhães
A primeira viagem documentada do homem branco ao extremo sul do continente americano foi realizada por Fernão de Magalhães em 1520, embora já tenha sido sugerido que o europeu já conhecia a região antes disso. De qualquer maneira, foi Magalhães quem deu o nome de Terra do Fogo à região, tendo avistado fogueiras acesas pelos índios nas margens do estreito que hoje leva seu nome.[4] A bordo ia também o italiano Antonio Pigafetta, que desempenhou importante papel científico escrevendo o primeiro léxico da linguagem daPatagônia, elaborado com o auxílio de um indígena capturado.[5] Outros navegadores depois dele se aventuraram pela Terra do Fogo, mas o primeiro que seguramente permaneceu um longo tempo em terra foiAlonso de Camargo, que em 1541 invernou em uma baía fueguina, possivelmente localizada na Ilha dos Estados ou na entrada do Canal de Beagle.[4]
Nesta altura todo o território fora reivindicado pela coroa espanhola, mas as incursões de exploradores e corsários ingleses e holandeses fizeram com que a Espanha planejasse a fortificação e povoamento da região. Foram enviadas várias naus com oficiais e colonos mas nenhuma logrou seu intento. Enquanto isso, a geografia fueguina ia sendo cartografada com precisão cada vez maior. No século XVIII continuaram as viagens exploratórias, acrescentando-se a participação francesa, e surgiram conflitos entre as potências europeias pela soberania da região, registrando-se batalhas navais e diversos naufrágios, além de ser concebido o primeiro plano de evangelização dos indígenas, que entretanto não se concretizou. Em 1771 Manuel Pando percorreu pela primeira vez documentadamente o Canal de Beagle e em 1788 a região foi estudada pela primeira vez por uma expedição científica, a mando do italiano Antonio Malaspina, que estava a serviço da Espanha. Em 1790 foi realizada outra, capitaneada por Juan José de Elizalde, a primeira de que participou um oficial argentino, Francisco José Cándido de Lasala. Aparentemente nesta época já havia se estabelecido um comércio de peles e óleo dos lobos-marinhos existentes na região.[6]

O Beagle encontra nativos fueguinos, em aquarela do artista da expedição, Conrad Martens
Em 22 de maio de 1826 zarpou da Inglaterra uma expedição científica liderada pelo capitão Philip Parker King. O capitão, contudo, por razões desconhecidas suicidou-se quando estava no Estreito de Magalhães, e o comando foi assumido pelo jovem imediato Robert FitzRoy. A viagem teve importantes consequências: nela foram capturados alguns nativos fueguinos e foi explorada uma grande parte do Canal de Beagle. Os nativos acabaram sendo levados para a Inglaterra e lá educados. Dois deles, que receberam os nomes de Jeremy Buttom e Fuegia Basket, conseguiram aceitar a educação e aprenderam a língua e os costumes ingleses. Sua presença na capital inglesa foi uma sensação, e acabaram sendo apresentados à corte. Disso resultou o projeto de uma missão para evangelizar os nativos.A viagem foi organizada e partiu em 27 de novembro de 1831, com FitzRoy ao comando do brigue HMS Beagle. Levava consigo o mais tarde celebrado naturalista Charles Darwin e o missionário Richard Matthews, bem como os índios que pretendiam devolver a seu povo. Enquanto o Beagle explorava os canais levantando sua cartografia e Darwin fazia importantes observações científicas, Matthews foi deixado em terra, em uma pequena cabana, para iniciar seu trabalho missionário. Com ele ficaram os índios, mas logo fugiram e retornaram ao estado selvagem. Quando o Beagle retornou pouco depois, Matthews estava desolado, pois além da fuga dos seus pupilos outros índios ameaçavam sua vida e haviam roubado tudo o que ele tinha consigo. Com isso, abandonou seu projeto e retornou para o Beagle.[7]

[editar]A colonização efetiva


O missionário Thomas Bridges em 1883, com sua esposa e indígenas na missão de Ushuaia

Uma vista da missão anglicana em 1883
Em 19 de junho de 1829 a Argentina, já independente, fez sua primeira afirmação de soberania sobre a Terra do Fogo, criando uma comandância militar, sediada nas Ilhas Malvinas. Pouco mais tarde os ingleses ocuparam as ilhas, dando margem a ideias de enviar novamente missionários anglicanos para a Terra do Fogo, mas as primeiras tentativas, organizadas por Allen Francis Gardiner, fracassaram diante da hostilidade dos indígenas e da falta de apoio oficial, acabando no martírio dos missionários. Enquanto isso a Argentina também fazia movimentos para a povoação do extremo sul. Em 1852 o oficial Luis Piedra Buena com sua família ergueu uma casa na Ilha dos Estados, cuja propriedade lhe foi outorgada pelo presidente Bartolomé Mitre em 1868, hasteando na ilha pela primeira vez a bandeira argentina. No ano seguinte Waite Hockin Stirling, antigo colaborador de Gardiner, levantou uma missão na Ilha Navarinoexatamente diante da futura Ushuaia, levando cabras e iniciando plantações a título de experiência. Logo compreendeu que o local não era adequado, e transladou-se para o outro lado do canal, escolhendo a península que fecha pela esquerda a Baía de Ushuaia, onde poderia ficar mais próximo dos indígenas. Ali a partir de 18 de janeiro de 1869 ergueu uma casa em um ponto elevado da península, cujo sítio é hoje um monumento nacional argentino.[8]
Embora Stirling contasse com a simpatia de alguns nativos, a quem ensinou os rudimentos do Evangelho e dos hábitos europeus, muitos outros ainda constituíam uma constante ameaça. Seu trabalho foi interrompido no fim do ano, quando foi designado bispo dadiocese anglicana da América do Sul, devendo retornar à Inglaterra para sua ordenação e empossamento no cargo. Outros missionários continuaram sua obra em Ushuaia, estabelecendo os inícios de um povoamento que desde então foi ininterrupto. Em 30 de março de 1870 chegou ao local Thomas Bridges, que foi o verdadeiro motor do povoamento inicial e estendeu a influência missionária por toda a região, paulatinamente ganhando a confiança dos indígenas e reunindo-os em grande número, não sem encontrar ao mesmo tempo inúmeras resistências e dificuldades de toda ordem. No ano seguinte foram batizados os primeiros indígenas, realizando-se também os primeiros casamentos cristãos entre eles. Bridges também foi importante por ter composto o primeiro dicionário da língua yagan e por ter realizado a primeira tradução de um texto bíblico para este idioma, uma versão do Evangelho de São Lucas intitulada Gospl Luc Ecamanaci. Entretanto, a despeito de seus esforços para a proteção dos índios, sua população decrescia dramaticamente, assolada por sucessivas epidemias trazidas pelo homem branco, sem contar os enfrentamentos violentos com outros exploradores europeus que resultavam em inúmeras mortes. Outros se entregavam à bebida ou vendiam suas filhas para se prostituírem para os marinheiros. Em meados da década de 1880 Bridges acusava a existência de somente 387 índios yagan em todo o arquipélago.[9]
Depois da partilha da Terra do Fogo entre Chile e Argentina em 1881, definindo seus limites, em 1883 o governo argentino decidiu enviar a "Divisão Expedicionária ao Atlântico Sul", sob o comando do coronel Augusto Lasserre, a fim de ali estabelecer subprefeituras. Sete navios de guerra foram designados para a missão, que aportou primeiro na Ilha dos Estados e em 1884 entrou na Baía de Ushuaia, apenas com quatro naus. Em 12 de outubro de 1884 foi enfim içada a bandeira argentina e criada a subprefeitura local, com Alejandro Virasoro y Calvo ocupando a primeira magistratura, auxiliado por 44 oficiais subalternos. A data constitui a fundação oficial da cidade. Poucos dias depois, em 16 de outubro, foi criado o Território da Terra do Fogo, do qual Ushuaia foi escolhida naturalmente como a capital, tendo Félix Paz como governador, e, no ano seguinte, como capital de um dos três Departamentos em que o Território foi subdividido. Paz transferiu em 1887 a subprefeitura para a Baía Bom Sucesso, e logo depois para a Baía Tétis, possivelmente para não confundir as administrações, mas a experiência não deu certo e Ushuaia voltou a acumular todas as funções em 1896.[10]

O povoado primitivo, em torno de 1897

Comemorações do carnaval de 1898 em Ushuaia

A primeira capela católica de Ushuaia
Enquanto os índios desapareciam quase completamente, aumentava devagar o número de colonos brancos, chegando grupos de espanhóis, portugueses, argentinos e italianos, bem como garimpeiros do ouro que fora descoberto no norte da ilha e que acabavam sempre gerando conflitos. Esses primeiros colonos brancos de Ushuaia também tiveram de lutar por sua própria sobrevivência, e vários abandonaram a comunidade, que sempre estava à míngua de apoio oficial e dependia em larga medida do intermédio da florescente cidade chilena de Punta Arenas para muitos serviços e abastecimento.[11] Um relato de 1893 do inspetor de escolas Raúl Díaz fez um retrato patético da situação do povoado:
"Dezesseis casas sem nenhuma comodidade formam ruelas visíveis unicamente devido à distância que as separam; cinco armazéns de pouca importância, uma escola com poucos meninos que quase sempre está fechada por falta de pessoal, uma serraria a vapor, boa obra do tenente-coronel Godoy, uma formosa e cômoda baía que os barcos frequentam só muito raramente, uma Missão anglicana na frente e por fim oitenta habitantes que vivem bocejando, isolados, a 600 léguas de Buenos Aires". [12]
Como Ushuaia agora era capital de um Território, aos poucos iam aparecendo algumas melhorias e a sociedade se organizava. No final do século XIX a escola foi reforçada com novos professores e foram criados o juizado de paz, o registro civil, o serviço médico, o correio, um destacamento policial, um pequeno cárcere, enquanto eram fundadas algumas estâncias na zona rural, além de ser construído o prédio do cabildo e se instituírem outras repartições públicas. Também sediou diversas expedições científicas nesta época, estrangeiras e nacionais, foi elaborada primeira planta urbana para orientar o futuro crescimento da cidade e começou a ser implantado um projeto de estabelecimento de uma colônia penal para fomentar o povoamento. Em 1895 havia uma população de 477 pessoas, com 225 delas vivendo na zona urbana, excluídos os índios. [13]
O trabalho das missões inglesas prosseguia com o beneplácito das autoridades argentinas, e atraíam indígenas de outras etnias, como os onas, que encontraram nelas um refúgio temporário até que as doenças também os dizimassem. As missões por outro lado tiveram uma importância econômica introduzindo o gado bovino, ovino e caprino na região, e iniciando a exploração e beneficiamento da abundante madeira da ilha. Bridges faleceu em 1898 em Buenos Aires, e sua obra foi continuada por seus filhos na sua Estância Harberton e outros seguidores na antiga sede na península, até que quase já não restavam mais índios, sendo a missão original encerrada em 1910. Os poucos índios remanescentes foram transferidos para outro estabelecimento na Ilha Navarino, sob os cuidados do missionário John Williams, onde permaneceram até 1913.[11] A constante presença dos anglicanos acabou por despertar a atenção dos eclesiásticos católicos argentinos. Os salesianos assumiram o encargo e enviaram para lá seu primeiro missionário em 1897, o padre Ramón Lista. Foi edificada uma capela em 1898, da qual foi nomeado pároco o padre Juan Fossatti.[14]

[editar]Século XX

No início do século XX apareceram os primeiros sinais de atividade intelectual autóctone em Ushuaia, através da fundação de alguns periódicos, e começava a se formar uma pequena elite de oficiais, comerciantes e estancieiros, que já podiam se dar ao luxo de possuir casas mais elegantes e bem decoradas e demonstravam possuir uma educação refinada. Um relato de Damiana, uma neta de Luiz Fique, um dos primeiros comerciantes de Ushuaia, dá uma visão do ambiente:

Em 1930

Presidiários trabalhando nas ruas de Ushuaia
"Lembro da ampla sala de refeições da casa de meus avós, quando mais de uma vez, postada junto ao umbral de uma de suas portas, olhava deslumbrada para as luzes dos lustres, em sua maioria de querosene, que iluminavam a larga mesa, adornada de candelabros e flores. As toalhas e os brancos guardanapos dobrados em forma de leque, que faziam reluzir a porcelana e a prataria, os aquecedores protegidos por biombos de estilo japonês, as duas sinetas sobre a mesa que faziam as vezes de gongo, chamando as criadas que, com seus aventais e toucas brancas, transportavam desde a cozinha os pratos fumegantes para serem servidos por minha mãe ou minha avó. Essas refeições aconteciam sempre em relação a algum evento especial, como as festas patronais ou os nascimentos, os batismos, a chegada de navios importantes .... Nestas oportunidades ouvia meu pai falar em diferentes idiomas. Os homens vestiam smoking, sapatos de verniz ou luvas brancas e as mulheres brilhavam em vestidos rodados. Enquanto isso, as crianças se divertiam com as duas pianolas da casa". [15]
Porém, o que dominou a vida da cidadezinha por toda a primeira metade do século foi a construção de um enorme presídio, iniciado em 1902 e ampliado várias vezes ao longo das décadas seguintes, destinado a receber condenados de todo o país. Isso desencadeou diversas melhorias na infraestrutura urbana, como a instalação da iluminação elétrica, de uma rede de telefonia, de um destacamento de bombeiros, uma farmácia, uma alfaiataria, uma sapataria, ateliês de fotografia, a criação de novos estabelecimentos comerciais e das primeiras indústrias, bancos e hotéis, além de os apenados servirem como mão-de-obra para todas as construções urbanas e obras públicas. Segundo Arnoldo Canclini, essas vantagens coexistiam com uma situação de forte tensão social, a de os habitantes conviverem diariamente com uma população penal igual ou maior do que a população residente, que vivia mais fora da prisão do que dentro dela e despertava temores de fugas ou de violências.[16]

Um dos primeiros aviões a pousarem em Ushuaia, na década de 1930

A vida social nos clubes de Ushuaia, 1942
Enquanto isso as atividades econômicas se fortaleciam principalmente através da criação de ovelhas, que obrigou à abertura de estradas, à construção de pontes e à instalação de frigoríficos e tosquias, sediados em estâncias de toda a ilha, e que desenvolviam também o comércio exportador para toda região e para o exterior. A importância dessa atividade se demonstra pelo impressionante tamanho do rebanho em 1925, com mais de um milhão de cabeças. Outras atividades econômicas que floresceram nas primeiras décadas do século foram a piscicultura e a pesca. Como havia originalmente apenas duas espécies de peixe nos rios da região, e impróprias para o consumo, foram introduzidos os salmonídeos, que acabaram por se tornar importantes para o abastecimento local e para o início do turismo através da pesca desportiva. Também começaram a ser exploradas as reservas de sardinhas, moluscos e crustáceos marinhos, com destaque para a centolla, um grande caranguejo. Contribuíram nesse campo novos grupos de imigrantes, especialmente espanhóis e croatas, desenvolvendo os aspectos industriais e náuticos da pesca.[17]
A administração pública, porém, enfrentava diversas dificuldades, diante da rápida sucessão de vários governantes e da pouca atenção recebida do governo nacional. A situação no presídio também não era fácil, havendo registro de revoltas, fugas e maus tratos nos apenados, aumentando as tensões e a sensação de abandono e isolamento da população. Além dos efeitos de um quadro político argentino tumultuado e de uma legislação confusa, os ecos da I Guerra Mundial e das atividades internacionais anarquistas e bolcheviques chegavam a Ushuaia, e tornavam tudo ainda mais incerto, prejudicando as obras públicas e os serviços oficiais. Boa parte da população abandonou a cidade e sua economia sofreu vários choques negativos. Compensatoriamente, a partir da década de 1920 houve avanços na saúde pública, na educação, nos transportes, na cultura, no turismo e na vida comunitária, chegando médicos e dentistas, ampliando-se a escola, fundando-se uma biblioteca, expandindo-se a navegação, criando-se a primeira linha aérea e um aeroporto e os primeiros clubes sociais e agremiações esportivas.[18]
Em 1947 o presídio foi fechado por decreto presidencial, encerrando uma importante etapa na história de Ushuaia e dando início a outra, substanciada também por reformas administrativas que haviam criado poucos anos antes a Governação Marítima da Terra do Fogo, submetendo a região ao controle direto do Ministério da Marinha, que criou ali uma base naval absorvendo as instalações da antiga missão anglicana e do presídio. Outras novidades foram a descoberta de petróleo na área e a chegada de um grande grupo de imigrantes italianos. Em 1957, depois de vários atos contraditórios, foi criado o Território Nacional da Terra do Fogo, Antártida e Ilhas do Atlântico Sul, com Ushuaia como a capital. No ano seguinte, se criava uma zona franca na Terra do Fogo, facilitando o desenvolvimento econômico e incrementando o turismo. Ainda em 1958 assumiu o governo o capitão Ernesto Campos, que foi uma figura decisiva para o progresso da cidade pela década seguinte, profundamente interessado pelos problemas locais e tendo permanecido no cargo até 1964, realizando muitas obras públicas.[19]

O ARA General Belgrano no porto de Ushuaia em 1982, antes de seu afundamento
Outra mudança na legislação em 1972 veio a influenciar de maneira importante a vida da cidade. Sob o slogan de "Promoção Industrial", a nova lei deu grandes incentivos para a fixação de novos residentes em uma área de crescente importância estratégica. Em função do súbito crescimento populacional, surgiram inúmeros novos estabelecimentos comerciais e industriais, cresceu a rede de serviços e foi ampliada a malha urbana. Por outro lado, questões ainda pendentes entre a Argentina e o Chile, a respeito da soberania sobre algumas ilhas do Canal de Beagle, tornaram até a década de 1980 o ambiente bastante tenso, e embora as difíceis negociações fossem desenvolvidas debaixo de muito segredo, vazaram informações desencontradas e formou-se um receio geral de se deflagrar um conflito armado. Outra questão internacional problemática com repercussão em Ushuaia foi a Guerra das Malvinas contra o Reino Unido. O porto local foi uma das bases navais da armada argentina, tropas se movimentaram ao norte e os náufragos do navio ARA General Belgranoforam atendidos em Ushuaia. Se bem que a possibilidade de um ataque britânico à cidade fosse remota, foram tomadas várias precauções que perturbaram a rotina dos habitantes.
A partir de 1982 a cidade e o Território foram objeto de profunda transformação institucional, inserindo-os definitivamente no cenário político da nação. Em 1983 pela primeira vez a Terra do Fogo participou de eleições nacionais, ocasião em que se elegeram pela primeira vez deputados e os vereadores e o intendente municipais, vencendo o pleito José Arturo Estabillo, do Movimento Popular Fueguino, encerrando com isso o sistema da indicação direta. O governador do Território, porém, ainda era escolhido por Buenos Aires. No ano de 1984 foi comemorado com grandes festejos o centenário da fundação da cidade, inflamando ainda mais o ânimo cívico da população. Em 1986 ocorreu a transformação do Território em Província, equiparando juridicamente a Terra do Fogo às outras províncias do país, permanecendo Ushuaia como sua capital. Neste momento a nova província possuía 57 mil habitantes, criava 661 mil cabeças de gado, explorava 140 mil m³ de madeira, 1,6 milhões de m³ de petróleo e 3,1 milhões de m³ de gás natural, pescava 300 t de peixes e mariscos, tinha 124 indústrias instaladas, 45 educandários e era visitada por 60 mil turistas anualmente. Em 1991 concluiu-se o processo de mudanças com a realização de eleições para o governo provincial, saindo vencedor o mesmo Estabillo.[21]
Nos anos recentes a cidade tem revelado pujança, tornando-se um forte pólo turístico, ao mesmo tempo em que se consolidam outras atividades produtivas, os serviços, a cultura e as instituições. Para o historiador Arnoldo Canclini, em virtude do notável progresso em muitas áreas nos últimos tempos, Ushuaia experimenta acelerada internacionalização dos hábitos, perdendo raízes tradicionais, e como organismo social ainda está em sua adolescência, com muito ainda por fazer para definir sua verdadeira identidade.
Fonte: Wikipédia.

Um comentário:

  1. Cara....seu blog é mais que uma incitação a viajar...é pura cultura! chrystiano ribeiro.

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